Valorização viabiliza demolição de prédios em bairros nobres

Edifícios são demolidos para dar lugar a prédios novos em áreas com alto preço de metro quadrado
Edifícios são demolidos para dar lugar a prédios novos em áreas com alto preço de metro quadrado.
Valorização viabiliza demolição de prédios em bairros nobres

Ana Luiza Tieghi, Valor Econômico – Em um trecho de quatro quadras da avenida 9 de Julho, no Itaim Bibi (SP), quatro prédios comerciais já foram derrubados ou serão removidos em breve para dar lugar a edifícios residenciais.

Os prédios estavam em uso, mas a valorização da área é tão grande que compensa para os incorporadores comprar os edifícios e arcar com a demolição para, em seguida, fazer novos produtos de alto padrão.

“O terreno é tão escasso que o incorporador tem que ser criativo”, afirma Fabiana Tomaz, sócia e head de desenvolvimento de negócios e aquisições da gestora Paladin. “Antes iam para bairros com terrenos, depois para os que têm casas, a consequência é irem para os bairros com prédios.”

A incorporadora Idea!Zarvos tem dois lançamentos no Itaim que ocupam terrenos onde antes existiam três prédios de escritórios. Para o sócio-fundador Otavio Zarvos, o fato de valer a pena derrubar as edificações para fazer outras é sintoma da alta concentração de renda da cidade, que cria uma “cilada urbanística”. “A mobilidade dessa classe super alta é muito pequena, ela vai para poucos bairros”, afirma. Por isso, há pressão para se criar novos projetos em áreas já adensadas, como no Itaim e em Pinheiros.

A gestora Tellus participa de empreendimento que será erguido onde hoje há um prédio de escritórios em demolição, na 9 de Julho. “É uma região muito valorizada, na qual compensa esse tipo de investimento”, afirma Daniel Takase, head de escritórios e imóveis de uso misto da empresa, que ressalta que não é uma operação padrão para a companhia. A área vai receber um prédio residencial.

Para Zarvos, seria preciso “forçar o mercado a ir para outros bairros”, mas as políticas urbanas agem no sentido contrário, de trazer mais adensamento nas regiões com infraestrutura.

Já Lucas Ferh, professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo do Mackenzie, tem visão oposta. “Faltam programas habitacionais para garantir que a população que mora longe venha mais próxima [da infraestrutura urbana]”, diz. Ele ressalta que a substituição de prédios pode levar a gentrificação, com o encarecimento da moradia no local.

No caso de troca de uso de escritórios para residencial, porém, há um benefício para a área, porque se fixa a população. No entanto, a destinação exclusiva para alto padrão tira parte da vantagem. O ideal, segundo ele, seria haver investimentos que garantissem também um mercado de habitação popular nessas novas áreas.

Demolir um prédio não é decisão simples. Em São Paulo, geralmente um edifício não pertence a um único dono. É preciso, então, convencer todos a venderem.

No empreendimento Damata, da Idea!Zarvos, onde foram demolidos dois prédios, Zarvos conta que as negociações com os donos de salas comerciais, cerca de 40, levaram dois anos. Uma saída foi incluir um prédio comercial no projeto. “A maioria preferiu trocar o escritório antigo por um novo, foi bom para os dois lados”, diz. Segundo ele, os prédios estavam desatualizados e tinham aluguéis baratos demais para a região.

Quando a demolição envolve prédios comerciais, pode ser mais fácil conseguir comprar as unidades. A situação se complica nos residenciais, por envolver memórias e apego ao imóvel.

Formar um terreno em uma área com casas pode ser tão difícil quanto comprar um prédio e já faz parte da rotina de incorporadores, ressalta Tomaz. A diferença é que um terreno formado por várias casas é adaptável. Se um proprietário se recusa a vender, é possível contornar sua área. Com prédios isso não acontece. Se alguém não vender ou houver problemas com a documentação, a compra inteira cai, afirma Tomaz.

A demolição em si começa com um levantamento de toda a vizinhança em um raio de 50 metros, conta Mauricio Bianchi, diretor de engenharia da Idea!Zarvos. Ele também dirigiu por dez anos as obras e demolições do Cidade Matarazzo. “Entramos em todos os vizinhos e fotografamos subsolo, térreo e detalhes da fachada”, diz. Também é feito um seguro.

A demolição é feita por empresas especializadas. Para orçar um projeto, elas primeiro visitam o prédio ou casa a ser derrubado e levantam o que poderá ser revendido, como revestimentos, louças metais e vidros, explica Bianchi. As construções vão de “porteira fechada” para os demolidoras, com tudo que não foi retirado pelos proprietários.

Materiais recicláveis, como ferro e plástico, são separados. Concreto, tijolos e argamassa podem ser triturados e reaproveitados na obra. Cleriston Oliveira, da demolidora C.R.O., afirma que o material “britado” é usado para forrar terrenos, fazer drenagem ou como base para asfaltamento, tecnologia que passou a ser mais usada na última década. “Conseguimos reaproveitar de 85% a 90% do material”, diz. O que não é reaproveitado tem que ir para aterros. A C.R.O. já demoliu prédios nos Jardins, em Santa Cecília, no Centro e na Vila Madalena.

Um prédio de dez andares pode ser demolido em 70 a 90 dias, segundo Oliveira, ou até oito meses, a depender do processo, afirma Bianchi. “Demolição e correria não combinam”. Isso não costuma atrasar a obra se for feito durante o período de aprovação e preparação do novo empreendimento, que pode levar quase um ano.

 No fim, demolir é uma questão financeira. Se o preço dos apartamentos que serão vendidos compensar o custo de aquisição dos prédios, a demolição e a nova obra, então, valem a pena. Rossano Nonino, sócio e diretor-executivo da gestora Fator Ore, afirma que um empreendimento se torna viável quando os custos com terreno e obra correspondem a 60% ou 65% do valor de venda das unidades.

Por esses motivos, não se vê em São Paulo uma corrida pela demolição de prédios, mas casos em áreas pontuais, que podem ficar mais comuns com o aumento de potencial construtivo dado pelo Plano Diretor para áreas com infraestrutura, segundo Ferh.

A reforma dos prédios, chamada de retrofit, é uma alternativa à demolição, mas nem sempre compensa para o incorporador. Tomaz destaca que um imóvel que passou por retrofit não é vendido pelo mesmo valor de um novo na mesma área, por ser adaptação. Além disso, dependendo do projeto, essa adaptação não é possível.

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